segunda-feira, 19 de agosto de 2024

ATOS DOS APÓSTOLOS (7:30-41)

A Recusa de Moisés e a Continuidade da Resistência: Uma Defesa de Estêvão

30 ¶ Decorridos quarenta anos, apareceu-lhe, no deserto do monte Sinai, um anjo, por entre as chamas de uma sarça que ardia. 31  Moisés, porém, diante daquela visão, ficou maravilhado e, aproximando-se para observar, ouviu-se a voz do Senhor: 32  Eu sou o Deus dos teus pais, o Deus de Abraão, de Isaque e de Jacó. Moisés, tremendo de medo, não ousava contemplá-la.

Estêvão continua sua defesa perante o Sinédrio, chegando a uma parte importante de seu discurso, onde destaca a resistência que o povo de Israel demonstrou desde o princípio contra seus pais espirituais. Ele volta ao contexto da vida de Moisés, explicando que, após matar um egípcio e ser descoberto, Moisés fugiu para Midiã, onde passou quarenta anos como pastor de ovelhas (Êxodo 2:11-15; Atos 7:29-30). Durante esse tempo, ele se casou, teve filhos e viveu uma vida simples, afastado dos grandes eventos do Egito. Contudo, no deserto do Monte Sinai (também conhecido como Horebe), Deus o chamou para uma missão extraordinária (Êxodo 3:1-2).

Estêvão menciona esse evento para enfatizar a soberania e a ação direta de Deus na história de Israel, mesmo quando os líderes do povo não reconheciam ou compreendiam os meios pelos quais Deus estava agindo. O relato demonstra que Deus não está limitado a um local ou a formas tradicionais de se revelar, como o Templo, algo que Estêvão estava tentando comunicar aos líderes religiosos que o estavam julgando (Atos 7:48-50). A sarça ardente no deserto é uma imagem poderosa da presença de Deus em lugares inesperados e em circunstâncias aparentemente comuns.

Essa passagem também prepara o terreno para a defesa de Estêvão contra as acusações feitas contra ele, reforçando a ideia de que Deus é livre para agir conforme Sua vontade, independente de estruturas humanas (Isaías 66:1-2).

33  Disse-lhe o Senhor: Tira a sandália dos pés, porque o lugar em que estás é terra santa. 34  Vi, com efeito, o sofrimento do meu povo no Egito, ouvi o seu gemido e desci para libertá-lo. Vem agora, e eu te enviarei ao Egito. 35  A este Moisés, a quem negaram reconhecer, dizendo: Quem te constituiu autoridade e juiz? A este enviou Deus como chefe e libertador, com a assistência do anjo que lhe apareceu na sarça.

Aqui vemos a primeira crítica direta que Estêvão faz às autoridades que o escutam. Ele faz referência à rejeição inicial de Moisés pelo povo de Israel, quando disseram: “Quem te constituiu como autoridade e juiz sobre nós?” (Êxodo 2:14; Atos 7:27). No entanto, aqueles que inicialmente o negaram foram os mesmos que posteriormente se submeteram a ele como líder. Estêvão destaca que o povo estava equivocado em suas conclusões iniciais.

Estêvão está dizendo às autoridades que o que estão fazendo contra a mensagem do evangelho, contra a Palavra e contra o próprio Jesus Cristo, já foi feito por seus antepassados no passado. Não apenas com Moisés, mas com todos os grandes libertadores que surgiram na história de Israel. A resistência e rejeição aos enviados de Deus eram comuns, e agora, eles estavam repetindo o mesmo erro ao resistir e rejeitar Jesus Cristo.

Quanto ao "Anjo do Senhor" que apareceu na sarça ardente, muitos estudiosos acreditam que essa manifestação poderia ser uma prefiguração de Jesus. Embora não haja uma narrativa bíblica clara que afirme diretamente isso, o contexto da salvação do povo de Israel e outras passagens sugerem que o "Anjo do Senhor" frequentemente mencionado poderia ser o próprio Jesus em uma teofania, uma manifestação visível de Deus na história.

Referências Bíblicas que Sustentam essa Interpretação:

1.    Êxodo 3:2-6 - No episódio da sarça ardente, o "Anjo do Senhor" aparece a Moisés. O texto diz que o Anjo do Senhor apareceu em uma chama de fogo e, em seguida, Deus falou com Moisés a partir da sarça, indicando que o Anjo do Senhor é identificado como o próprio Deus.

2.    Gênesis 16:7-13 - O "Anjo do Senhor" aparece a Hagar no deserto. Ela reconhece que viu "Aquele que me vê", indicando que ela viu mais do que um simples anjo, mas o próprio Deus.

3.    Gênesis 22:11-18 - O "Anjo do Senhor" aparece a Abraão e, em nome de Deus, promete abençoá-lo. Aqui, o Anjo do Senhor fala com autoridade divina, prometendo bênçãos que normalmente apenas Deus pode prometer.

4.    Juízes 13:18-22 - O "Anjo do Senhor" aparece a Manoá e sua esposa, pais de Sansão. Quando Manoá percebe que era o Anjo do Senhor, ele diz: "Certamente morreremos, porque vimos a Deus!" Isso sugere que o Anjo do Senhor não era apenas um mensageiro, mas uma manifestação de Deus.

5.    Zacarias 3:1-2 - O "Anjo do Senhor" aparece diante de Josué, o sumo sacerdote, e repreende Satanás. Aqui, o Anjo do Senhor parece exercer autoridade divina.

Essas passagens são algumas das muitas onde o Anjo do Senhor é tratado com reverência e autoridade que normalmente seriam reservadas ao próprio Deus, levando à conclusão de que estas aparições podem ser manifestações pré-encarnadas de Cristo.

36  Este os tirou, fazendo prodígios e sinais na terra do Egito, assim como no mar Vermelho e no deserto, durante quarenta anos. 37  Foi Moisés quem disse aos filhos de Israel: Deus vos suscitará dentre vossos irmãos um profeta semelhante a mim.

Estêvão argumenta que o próprio Moisés já havia anunciado a vinda de alguém que seria semelhante a ele (Deuteronômio 18:15; Atos 7:37). Embora Jesus, como Filho de Deus, seja infinitamente superior a Moisés, dentro do contexto histórico de Israel, Moisés desempenhou um papel crucial em moldar a nação, tanto como líder quanto como figura de autoridade espiritual. Moisés era reverenciado por todas as gerações subsequentes.

Quando Moisés se referiu ao surgimento de um profeta semelhante a ele, ele estava estabelecendo um padrão de liderança espiritual e autoridade. Essa descrição abre espaço para que se reconheça Jesus como o cumprimento dessa profecia, pois Ele preenche esses requisitos de maneira perfeita e completa, sendo o representante final e supremo dessa promessa.

38  É este Moisés quem esteve na congregação no deserto, com o anjo que lhe falava no monte Sinai e com os nossos pais; o qual recebeu palavras vivas para no-las transmitir.

Esse mesmo Moisés, que anunciou a vinda desse poderoso profeta, é o mesmo que recebia do Anjo do Senhor palavras vivas do próprio Deus. Moisés tinha autoridade e respeito por tudo o que anunciava, especialmente sobre o profeta que seria como ele. Esse profeta, conforme Moisés previu, criaria seguidores e traria uma nova perspectiva—agora, sob a nova aliança, a graça de Deus.

39  A quem nossos pais não quiseram obedecer; antes, o repeliram e, no seu coração, voltaram para o Egito, 40  dizendo a Arão: Faze-nos deuses que vão adiante de nós; porque, quanto a este Moisés, que nos tirou da terra do Egito, não sabemos o que lhe aconteceu. 41  Naqueles dias, fizeram um bezerro e ofereceram sacrifício ao ídolo, alegrando-se com as obras das suas mãos.

Apesar de Moisés ter recebido palavras vivas diretamente de Deus, o povo de Israel rejeitou-o em seus corações. Eles desejavam abandonar tudo o que estavam vivendo no deserto e voltar para a escravidão no Egito. Em uma tentativa desesperada de substituir Moisés e o próprio Deus, durante uma das visitas de Moisés a Deus—quando ele estava demorando a voltar e posteriormente traria os Dez Mandamentos—o povo fez uma imagem, um bezerro de ouro, para adorar enquanto Moisés não retornava (Êxodo 32:1-4).

Essa atitude de rejeição e rebeldia do povo de Israel contra Moisés é central na defesa de Estêvão. Ele mostra que essa rejeição não era um caso isolado, mas parte de um padrão contínuo de resistência contra os líderes e profetas enviados por Deus ao longo da história. Da mesma forma que Israel rejeitou Moisés e se voltou para ídolos, agora estavam rejeitando Jesus Cristo, o profeta prometido por Moisés e o próprio Filho de Deus. Estêvão argumenta que, assim como seus antepassados rejeitaram os mensageiros de Deus, seus acusadores estavam repetindo o mesmo erro ao rejeitar e perseguir Jesus e seus seguidores (Atos 7:51-53).

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