A comunidade cristã (a igreja)
32 ¶
Da multidão dos que creram era um o coração e a alma. Ninguém considerava
exclusivamente sua nem uma das coisas que possuía; tudo, porém, lhes era comum.
Eles compartilhavam todos os seus bens, não havia egoísmo entre
eles, tudo era considerado comum entre todos. A sociedade perfeita funciona
assim, com todos sendo de coração e alma unidos (Salmos 133:1 João 17:21).
Em uma sociedade perfeita não pode haver desabrigados ou pessoas com
fome, e no início da igreja primitiva, funcionou muito bem a partilha e a
comunhão entre si de seus bens, mas não foi duradouro.
Comunistas e socialistas costumam citar passagem como essa para
afirmar que Deus governava dessa forma. Mas durante o crescimento da igreja,
observamos muitas doutrinas que eram praticadas no início e que foram sendo
extintas ou aprimoradas ao longo do tempo. Sobre a questão de compartilhar tudo
entre todos, foi uma das práticas que foi aprimorada.
Infelizmente, esse tipo de governo iguala todos em um mesmo patamar:
a pobreza. Mesmo entre irmãos, há aqueles que querem comer sem querer trabalhar
(2 Tessalonicenses 3:10). Esse tipo de governo atrai e cria muitos preguiçosos
que apenas desejam se sustentar às custas de outros, buscando apenas serem
mantidos, e isso pode até funcionar inicialmente quando têm riquezas
compartilhadas por outros, mas eventualmente essas riquezas se esgotam. Quando
isso acontece, gera pobreza e fome para todos os envolvidos.
Essa situação ocorreu posteriormente com esse grupo de pessoas,
pois, ao compartilharem tudo, passaram por um período difícil no qual
precisaram ser socorridos por outras igrejas por meio de ofertas, para que os
irmãos em Jerusalém pudessem superar a fome (Atos 11:29).
Isso não anula a grandeza que tinham em compartilhar tudo entre
todos, mas até mesmo esse tipo de gesto deve ser feito com sabedoria e
discernimento. A partilha generosa e o altruísmo são valores fundamentais, mas
precisam ser equilibrados com uma gestão prudente e responsável dos recursos. A
prática de compartilhar tudo entre todos na igreja primitiva era um reflexo da
união e do amor fraternal que permeava a comunidade, e funcionou bem em um
contexto de forte coesão social e espiritual. Contudo, com o crescimento e a
expansão da igreja, surgiram novos desafios que exigiram ajustes e adaptações
nas práticas comunitárias.
Ao longo do tempo, os líderes da igreja perceberam a necessidade de
estabelecer diretrizes mais estruturadas para a administração dos recursos.
Isso incluiu a promoção do trabalho diligente entre os membros, para evitar a
dependência excessiva e incentivar a contribuição ativa de cada indivíduo para
o bem comum. A advertência de Paulo em 2 Tessalonicenses 3:10, "Se alguém
não quiser trabalhar, também não coma", ilustra a importância de
equilibrar a generosidade com a responsabilidade pessoal.
Em resumo, a generosidade e o compartilhamento são virtudes a serem
cultivadas, mas devem ser exercidas com discernimento e responsabilidade, para
garantir que todos possam prosperar juntos, sem criar dependências prejudiciais
ou esgotar os recursos comuns. A verdadeira sabedoria reside em encontrar o
equilíbrio entre a compaixão e a prudência, promovendo uma comunidade justa e
solidária, mas também resiliente e sustentável.
33 Com grande poder, os apóstolos davam
testemunho da ressurreição do Senhor Jesus, e em todos eles havia abundante
graça.
Com grande poder, ou seja, com pregações poderosas, eficazes e
contundentes, davam testemunho da ressurreição do nosso Senhor Jesus Cristo
(Atos 4:33). As pregações eram sobre o evangelho, sobre Jesus, sobre o
testemunho que tinham frente aos milagres que viram e sobre a revelação da
salvação pela graça de Deus, não eram sobre subir em um púlpito e pregar sobre
o que fizeram na semana, não eram sobre pregar suas próprias vidas, mas sim
testemunhar o evangelho, e isso faziam com grande poder.
Os apóstolos proclamavam a ressurreição de Jesus com grande poder, e
a graça abundante estava presente na comunidade (Atos 4:33). A pregação eficaz
dos apóstolos e a graça abundante lembram outros eventos e ensinamentos
bíblicos (Romanos 15:19; 2 Coríntios 12:9). A pregação poderosa e a graça são
sinais da presença ativa de Deus entre Seu povo, fortalecendo-os e guiando-os.
34 Pois nenhum necessitado havia entre eles,
porquanto os que possuíam terras ou casas, vendendo-as, traziam os valores
correspondentes 35 e depositavam aos pés
dos apóstolos; então, se distribuía a qualquer um à medida que alguém tinha
necessidade.
Os crentes demonstravam extrema generosidade, vendendo suas
propriedades e distribuindo os recursos conforme a necessidade. Este ato de
generosidade pode ser comparado a outras práticas e ensinamentos bíblicos:
Deuteronômio
15:4: "Contudo, não
haverá entre ti pobre; pois o Senhor, certamente, te abençoará na terra que o
Senhor, teu Deus, te dá por herança, para a possuíres."
Lucas
12:33: "Vendei vossos
bens e dai esmolas; fazei para vós bolsas que não se envelheçam, tesouro nos
céus que nunca acabe, aonde não chega ladrão e a traça não rói."
Esses versículos mostram o ideal de uma comunidade sem necessitados,
uma visão que os primeiros cristãos procuraram realizar (Atos 4:34-35). Não há
dúvidas de que esse tipo de comportamento é virtuoso, mas, como foi explorado
nos versos 32 (Atos 4:32), esse tipo de prática foi aperfeiçoado com o tempo de
modo a evitar que preguiçosos tornassem um peso para os outros e, em momentos
de crise, como o citado em Atos 11:29, causassem colapso nesse tipo de
comunidade.
A verdade é que não podemos nos apegar a tudo e considerar que tudo
é nosso. Deus nos dá sementes também, e essas sementes servem para plantar,
para semear, para ajudar. Não “coma” também as sementes; tenha o hábito de
ofertar com sabedoria. Isso não ajuda a Deus, Ele não precisa de nossas
ofertas, mas é um ato que simboliza que não somos apegados e nem dependentes do
dinheiro. É um ato de gratificação, demonstrando gratidão a Deus ofertando e
ajudando o próximo (2 Coríntios 9:10; Lucas 6:38; Provérbios 11:24-25;
Malaquias 3:10).
36 José, a quem os apóstolos deram o sobrenome
de Barnabé, que quer dizer filho de exortação, levita, natural de Chipre,
37 como tivesse um campo, vendendo-o,
trouxe o preço e o depositou aos pés dos apóstolos.
Barnabé é um exemplo específico de generosidade. Ele vendeu um campo
e entregou todo o valor aos apóstolos, demonstrando seu compromisso com a
comunidade e com Deus. Barnabé é mencionado várias vezes no Novo Testamento
como um exemplo de encorajamento e apoio, além de ser também um dos pilares da
igreja primitiva (Atos 11:24; Atos 13:2).
Assim como na primeira igreja, devemos buscar essa unidade em nossas
congregações, promovendo um espírito de comunhão e amor. A oração e o
compromisso com a causa comum do Evangelho são fundamentais (Efésios 4:3). A
prática de compartilhar recursos pode ser aplicada hoje em dia também em nossas
igrejas, seja através de programas de assistência social ou ajudando alguma
família específica. Há várias formas de aplicar a generosidade (Atos 2:44-45).
Quando nossas pregações deixam de ser somente sobre "como
podemos crescer nesta vida" e passam a ser sobre o crescimento de todos,
quando deixam de ser individuais e passam a atender aos interesses coletivos, a
igreja aprenderá mais sobre união. Deixará de ser egoísta, de pensar somente em
si mesma, e até mesmo as ofertas crescerão. Como está escrito, "Não atente
cada um para o que é propriamente seu, mas cada qual também para o que é dos
outros" (Filipenses 2:4). "Levai as cargas uns dos outros, e assim
cumprireis a lei de Cristo" (Gálatas 6:2). "Dai, e ser-vos-á dado;
boa medida, recalcada, sacudida e transbordante" (Lucas 6:38).
Portanto, ao promovermos um espírito de generosidade e serviço
mútuo, alinhados com os ensinamentos de Cristo, poderemos experimentar um
crescimento espiritual coletivo e mais profundo, refletindo verdadeiramente o
amor de Deus em nossas ações diárias.
Devemos também nos esforçar para viver de forma que nosso testemunho
cristão seja claro e poderoso, refletindo a graça de Deus em nossas vidas
(Colossenses 4:6). Uma boa maneira de fazer isso é seguir o exemplo de Barnabé,
sendo encorajadores e ajudando os necessitados, o que certamente irá inspirar
outros a fazerem o mesmo (Hebreus 10:24).
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